Para completar, Foucault, ainda:
"Tudo está solidamente amarrado no interior de um espaço escolar: um quadro mostra um desenho que mostra a forma de um cachimbo; e um texto escrito por um zeloso professor primário mostra que é bem de um cachimbo que se trata. Não vemos o dedo indicador do mestre, mas ele reina em todos os lugares, assim como sua voz, que está articulando claramente: 'isto é um cachimbo'.
Do quadro à imagem, da imagem ao texto, do texto à voz, uma espécie de dedo indicador geral aponta, mostra, fixa, assinala, impõe um sistema de reenvios, tenta estabilizar um espaço único. Mas por que introduzi ainda a voz do mestre ? porque mal ela disse 'isto é um cachimbo', e já foi obrigada a retomar e balbuciar: 'isto não é um cachimbo, mas o desenho de um cachimbo', isto não é um cachimbo, mas uma frase dizendo que é um cachimbo' 'a frase: 'isto não é um cachimbo', não é um cachimbo'; 'na frase: 'isto não é um cachimbo', isto não é um cachimbo: este quadro, esta frase escrita, este desenho de um cachimbo, tudo isto não é um cachimbo'.
As negações se multiplicam, a voz se embrulha e engasga; o mestre confuso abaixa o dedo indicador estendido, dá as costas ao quadro-negro, olha os alunos, que se torcem de tanto rir, e não se dá conta de que, se eles riem tão alto, é que, acima do quadro-negro e do mestre balbuciando suas denegações, um vapor que acaba de se elevar pouco a pouco tomou a forma e agora desenha, com toda exatidão, um cachimbo. 'É um cachimbo, é um cachimbo' gritam os alunos em algazarra, enquanto o mestre, cada vez mais baixo, mas sempre com a mesma obstinação, murmura, sem que ninguém mais o escute: e, entretanto 'Isto não é um cachimbo'. "
Isto não é um cachimbo. p.35-36.
LM
15 de abr. de 2008
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