2 de set. de 2009

Desde quando internet é igual a rádio e tevê?

Completamente despropositada a proposta votada na Comissão do Senado nesta quarta-feira, 2, sobre o uso da internet em campanhas eleitorais. O projeto de lei segue para o Plenário na próxima semana.

As regras limitam o jornalismo digital: portais, sites de notícias e blogs estarão proibidos de emitir opinião. As charges serão vetadas e ao menos dois terços dos candidatos terão de ser convidados a participar de qualquer debate.

Há, pelo menos, dois erros crassos na redação do artigo 45 que integra o projeto de reforma eleitoral:

1) internet não é igual a rádio e tevê
2) definição de comunidades

Isso leva à seguinte conclusão: quem elaborou o texto desconhece o que é a cultura de rede.

Uma das recomendações é que só vale propaganda eleitoral em comunidades. Só há um porém: faltou explicar o que é comunidade e quais comunidades estão liberadas. Orkut é comunidade? Facebook é comunidade? Twitter é comunidade? You Tube é comunidade? Qual é a diferença entre comunidade e rede social?

A noção de comunidade vem, aos poucos, sendo reconfigurada para a idéia de possibilitar formas de associação além de um perímetro determinado. Nessa perspectiva é que tem se estabelecido as relações na internet. Não só as relações, mas toda a lógica de participação.

Como operam Facebook, Twitter, You Tube, Orkut, Flickr e MySpace, entre outras tantas redes? Na lógica da narrativa transmídia, ou seja, plataformas de conteúdo integradas. Essa noção coloca em questão as noções de comunidade e redes sociais.

A diferença está na forma de associação, e as redes sociais permitem novas formas de associação, para além da esfera geográfica e da idéia de vizinhança. Isso muda o padrão de comunicação que vigorou no século 2o - produção, transmissão e recepção.

Passam agora a fazer parte da comunicação os termos: incorporar, anotar, comentar, responder, agregar, cortar, compartilhar, além das palavras em inglês download, upload, input e output. O que coloca em perspectiva as ações na world wide web, espaço livre por excelência, cuja navegação é nomádica e o conteúdo é construído a partir do compartilhamento de dados.

Internet of things
Quando se fala em compartilhar dados, certamente áudio, texto, fotos e vídeos integram essa estrutura. Se a web é multimídia e híbrida, não pode ser comparada à tevê ou ao rádio. Sobretudo porque também está em discussão a obsolescência de dispositivos específicos a uma única função.

Hoje, há rádios que permitem download de músicas por celular, há televisores programados para receber vídeos ou fotos por plataformas open source. Daqui a pouco tempo, chegarão ao mercado objetos conectados, é a chamada internet of things (internet das coisas).

Quem disse que o You Tube é tevê?
Sendo assim, o que está em jogo é entender por que a internet tem de ser regulamentada a partir de leis de rádio e tevê. Mais do que reproduzir metáforas analógicas, é preciso compreender que, diferente dos grandes conglomerados de mídia, há milhares de pessoas conectadas em torno de redes sociais organizadas de variadas nacionalidades e origens sócio-econômicas.

Até o Supremo Tribunal Federal julgou a web como ambiente livre:

“Silenciando a Constituição quanto ao regime jurídico da internet, não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias, debate, notícia e tudo o mais que se contenha no conceito essencial da plenitude de informação jornalística no nosso país”.

Em tese, essa decisão pode pôr fim as restrições impostas por senadores e deputados porque o acórdão (julgamento), divulgado nesta quarta, sobre a lei de imprensa de março passado tem força constitucional.

Precisa explicar mais?

A pensar,

LM

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